Fact Checking: Como se faz na comunicação regional?
24 JANEIRO 2024
O Autoavaliação foi recolher o testemunho e a perspetiva da jornalista Micaela Costa do Jornal do Centro acerca do tema Fact Checking, e perceber de que modo é feita a verificação de factos e o combate à desinformação por uma jornalista que desenvolve o seu trabalho num meio de comunicação regional.
por Carla Ferreira

Jornalista Micaela Costa do Jornal do Centro
Carla Ferreira: Qual é o seu principal local de trabalho na atividade jornalística?
Micaela Costa: É na redação do Jornal do Centro.
CF: Que tipos de fontes, normalmente, utiliza na sua atividade jornalística?
MC: Contactos que eu fui arranjando, fontes e organismos oficiais e outros meios de Comunicação Social.
CF: Que metodologias utiliza nesse contacto com as fontes?
MC: Depende da fonte. Se forem aquelas fontes que vou arranjando ao longo da vida, de pessoas que vou conhecendo, o contacto é um pouco mais informal. Se forem organismos o contato acaba por ser muito mais formal. Normalmente é quase sempre por telefone ou numa outra situação pode ser presencial. Para um assunto oficial o contato é diferente, é mais institucional, normalmente é por telefone ou então é marcada uma entrevista ou conversa presencial.
O contacto com as fontes que vou arranjando ao longo da nossa vida pode acontecer num café ou até na rua. O WhatsApp também é uma boa forma de trocar informação.
CF: No meio de comunicação social para o qual trabalha existe autonomia dos jornalistas para escolherem as suas fontes?
MC: Sim.
CF: Nesse meio de comunicação social existe autonomia do jornalista para gerir a informação transmitida pelas fontes?
MC: Sim, mas depende da informação. Contudo, há sempre uma grande autonomia e um grande espaço de conversa entre a direção do jornal e a redação para podermos chegar ao consenso de quando publicar o que as nossas fontes nos revelam.
CF: Tem conta nas redes sociais?
MC: Tenho, mas não em todas.
CF: Em que redes?
MC: Tenho Facebook por questões profissionais, para procurar informação, não é uma fonte de informação, mas é um sítio para procurar informação, até mesmo nos comentários encontra-se muita coisa. Tenho o Facebook, o Instagram, o Twitter, o WhatsApp e o Telegram.
CF: Apresenta-se como jornalista nas redes sociais em que está presente?
MC: Não.
CF: Porquê? Indique um motivo.
MC: Não tenho uma resposta. Às vezes nem as minhas notícias assino, porque não acho que isso seja importante, não acho que as pessoas tenham de saber quem eu sou, têm é de gostar ou achar interessante e pertinente aquilo que eu faço e não quem eu sou, muitas vezes até faço questão de que não saibam.
CF: Caso tenha produzido ou produza conteúdos jornalísticos com base em informações recolhidas nas redes sociais, quais são os procedimentos que utiliza para verificar essa informação?
MC: Aqui privilegia-se sempre as fontes oficiais para se ter uma base muito forte, tendo em conta o tema que for. Por exemplo, encontrei no outro dia numa rede social uma árvore de 13 metros construída com garrafas de água que supostamente foi feita pelos bombeiros de Tondela. Então, como saber se é verdade ou não? Há que ligar para os bombeiros e confirmar. No fundo, trata-se de contactar a entidade e outras pessoas para encontrar o ponto de verdade e depois, a partir daí, fazer todo o resto do processo.
CF: Acha que a desinformação é um problema relevante no contexto português?
MC: Muito. Sim, afeta, e é um grande desafio para nós porque todos os dias lutamos contra essa desinformação que, às vezes, parece informação verdadeira o que é ainda mais grave.
CF: Considera que a legislação portuguesa é adequada para responder aos problemas da desinformação?
MC: Confesso que não conheço muito sobre a legislação, mas suficiente não deve ser, senão a desinformação já não existia como ainda existe.
CF: Acha que as soluções de auto-regulação jornalística, profissional ou sectorial, são adequadas para responder aos problemas da desinformação?
MC: Uma boa parte, sim. O nosso código deontológico já nos obriga a determinadas formas de agir. Muito antes de se falar em desinformação ou fake news, nós já éramos obrigados a ter determinados procedimentos que nos dessem garantias de que aquilo que estamos a dizer é verdade e não uma alucinação qualquer, por isso, eu acho que uma boa parte já estava feita. O problema é que às vezes essa desinformação não vem dos jornalistas, nem dos jornais, vêm de outras plataformas que nós não conseguimos controlar. Eu acho que enquanto jornais, televisões, rádios já há muito tempo que está tudo muito bem definido no sentido de se ter a certeza de que a informação é correta.
CF: E a nível de políticas públicas, acha que poderia ser feito mais qualquer coisa que também viesse no sentido de ajudar a combater a desinformação?
MC: Sim, se calhar se houvesse uma mão “mais pesada” para quem dissemina desinformação, essas pessoas pensariam duas vezes antes de publicar sem verificar. Seria também importante a existência de legislação um pouco mais “apertada”, mais controladora para o comum mortal, que às vezes, é a pessoa que começa a espalhar a desinformação, bem como para os jornalistas.

Instalações do Jornal do Centro
CF: O Meio de Comunicação para o qual trabalha possui instrumentos adequados para responder aos problemas da desinformação?
MC: Se fossemos mais jornalistas na redação seria melhor porque teríamos mais tempo para nos dedicar a investigar mais, a estar mais no terreno, a falar com mais pessoas. As redações cada vez mais reduzidas podem, por vezes, constituir um problema na questão do combate à desinformação.
CF: O meio de comunicação social para qual trabalha dispõe de mecanismos de autorregulação? Quais?
MC: Sim, temos o código deontológico que nos obriga a determinadas condutas. Também conversamos muito, debatemos muitos assuntos para chegarmos a um consenso.
CF: Para além desses mecanismos de autorregulação e de normas e orientações para esse contexto também dispõe de mecanismos de transparência e participação?
MC: Sim, tudo o que é opinião percebe-se perfeitamente que é opinião, o que é notícia percebe-se que é notícia. Também gostamos de assinar, eu por acaso até sou a que mais falho nisso, mas normalmente os trabalhos são assinados.
CF: Que instrumentos ou ferramentas é que, normalmente, utiliza para verificação de factos?
MC: Os contactos de que falávamos há pouco, procurar informação sobre o assunto em questão e fazer pesquisa no nosso próprio jornal. Nós próprios também podemos ser uma boa fonte, uma boa ferramenta para além de todos os contactos que podemos fazer.
CF: Então, na sua opinião, que outros meios é que também seriam necessários para ajudar a uma eficiente verificação de factos?
MC: O ideal era ter um total controlo das redes sociais e da Internet. Eu acho que a Internet e as redes sociais trouxeram o boom da desinformação, que sempre houve. A desinformação não é uma questão de agora, há muitos anos que existe, não chegava era a tantas pessoas como atualmente. Também seria importante as pessoas terem mais vontade de querer saber mais. Penso que as pessoas são as culpados da desinformação por não quererem verificar a informação. Não procuram saber mais, não questionam os outros, não leem. Sobretudo, seria necessário começar pelos mais novos para que se tornem autocríticos.