Informação falsa causa mais danos na imprensa regional?
8 DEZEMBRO 2023
O Autoavaliação foi verificar os efeitos da desinformação junto de um órgão de comunicação social regional, quais os mecanismos que utilizam e se existem normas procedimentais. Sandra Rodrigues, diretora de informação do Jornal do Centro, revela como este jornal, com presença na região de Viseu, combate um fenómeno que também existe no Interior do país.
por João Micaela

João Pedro Micaela: A desinformação é uma preocupação do Jornal do Centro?
Sandra Rodrigues: Sim, até porque o Jornal do Centro tem 2 responsabilidades neste campo, uma é aquela que todos os jornais nacionais ou internacionais têm, depois acresce o facto de sermos um jornal local. Nós estamos muito próximo das pessoas e a proximidade dá-nos aqui uma responsabilidade maior, porque o impacto de uma informação falsa neste meio poderia causar danos na própria estrutura social em que nos inserimos. É por isso nossa missão dar ao leitor toda a informação para que ele, usando o sentido crítico, possa estar esclarecido.
“Somos bombardeados com e-mails”
JM: Fundado em 2002, o Jornal do Centro viria a transitar para formato digital em 2017. Estando presentes na internet, sentem que estão mais vulneráveis à desinformação?
SR: Antes de mais, será importante referir que este ano retomamos a edição do jornal em papel, Em 2017 adquirimos uma rádio, passámos a ter uma presença mais forte no online, adquirimos também uma TV, que eu ainda considero ser apenas um espaço multimédia, e, portanto, estas são as 4 grandes plataformas em que operamos atualmente. A preocupação com a desinformação é comum em todos os suportes e torna-se essencial, não só que o leitor tenha sentido crítico, mas principalmente que o jornalista esteja na posse desta importante característica para filtrar os imensos e-mails, telefonemas e informação que nos chega diariamente.
Faz parte da rotina do jornalista questionar as pessoas e não há informação que não chegue aqui que não seja verificada.

Exemplar de um dos últimos semanários em papel a chegar às bancas. Após uma paragem na edição do jornal, neste suporte, o Jornal do Centro recupera desde agosto deste ano a edição em papel.

JM: Existe, desde então, alguma norma?
SR: Sempre existiram normas. Começando pelo número elevado de e-mails recebidos diariamente. Torna-se essencial uma análise criteriosa do seu conteúdo e proveniência. Damos o exemplo de uma Câmara Municipal, será de esperar que seja uma origem idónea, mesmo assim atendemos ao conteúdo e caso nos suscite dúvidas, ligamos para o responsável para confirmar. Se é um e-mail de uma pessoa ou instituição que nós não conhecemos temos 3 formas, pesquisamos na Internet a fonte e a informação, usamos o telefone para chegar à fala com as pessoas envolvidas e por último podemos recorrer à nossa base de notícias para verificar a informação.
Posso dizer que notícias que fizemos há 1 ou 2 anos já nos foram úteis para validar uma informação que estávamos a receber.
Durante a pandemia alterámos um pouco os procedimentos. Havia muita informação e muita dela era desconhecida para todos e o mais desafiante era a verificação junto dos organismos oficiais que nem sempre estavam disponíveis ou em funcionamento. Foram alturas complicadas e foi necessário fazer uma triagem daquilo que deveria ou não deveria ser informação, porque fazer fact checking era quase impossível.
JM: Estas diretrizes estão formalizadas em forma de circular ou manual de procedimentos?
SR: Há um manual que nos regula que é o Código Deontológico e embora não tenhamos um livro de estilos, digamos assim, onde as normas se encontrem escritas, temos todos o compromisso com aquele Código. Além disso, o tamanho da redação facilita a instituição de algumas regras que se ajustam às diferentes situações com que nos deparamos.

”Uma equipa reduzida apresenta um desafio na verificação da informação, mas por outro lado os procedimentos são mais simples de implementar”, refere a diretora de informação.
“O alerta é dado pelos nossos leitores”
JM: Já tiveram necessidade de se retratar sobre alguma informação que tenham dado ou uma eventual notícia falsa?
SR: Sim, já tivemos de nos retratar por termos analisado mal as informações, ou seja, interpretamos mal a mensagem inicial o que influenciou a forma como escrevemos a notícia. Outra situação esteve relacionada com o simples facto de que a escrita da notícia não passou da melhor forma para o leitor. Quanto a notícias falsas, não me recordo de ter acontecido. O alerta é dado pelos nossos leitores que são atentos ou ainda por algum dos envolvidos.
JM: O imediatismo é o culpado da falta de tempo para verificação dos factos?
SR: É, sem dúvida. Imaginemos que temos 30 notícias no dia para publicar, nós não podemos verificar as 30 notícias com 30 pessoas diferentes, nestes casos recorremos a um conjunto de conhecimentos de terreno que vamos adquirindo para avaliar imediatamente a veracidade daquela fonte. No entanto, não é porque a fonte, por mais credível que seja, nos envia uma informação que ela passe a notícia daquela forma ou até que passe a notícia.
Agora, se for uma informação básica, como uma exposição, um espetáculo ou uma inauguração, nós não poderemos ter o mesmo nível de aprofundamento, porque nos retiraria tempo para verificar as restantes informações.
Já nos confrontámos com a tentação de ser os primeiros a dar uma grande informação, mesmo assim conseguimos ter o tempo de reflexão necessário para adiar a publicação ou para não a difundir.
É frequente assistirmos em meios de comunicação nacionais ao domínio do imediatismo sobre a verdade dos factos, talvez porque se acredite que a audiência se multiplica, uma quando se noticia e outra quando se retifica. No Jornal do Centro não sentimos tanto isso, porque estamos circunscritos ao Distrito e não temos a pressão que outros têm.
